O jornalista Fábio Oliva (foto) sentiu na pele o caos promovido em sua cidade por administrações corruptas: Morador de Januária, no Norte de Minas, viu seu pai morrer em uma ambulância que ficou sem combustível durante o trajeto para o hospital.
Anos mais tarde, observou um sobrinho que passava mal ser encaminhado para a cidade vizinha porque o posto de saúde local não tinha nem mesmo luvas descartáveis para o atendimento médico. Foi assim que decidiu reunir alguns parentes e fundar a Associação Amigos de Januária (Asajan).
Fábio é um exemplo entre muitos cidadãos que se organizam em pequenos grupos e associações para combater situações como essas, que ocorrem diariamente em várias cidades, resultado da corrupção de alguns governantes brasileiros.
Desde a fundação da Asajan, em 2004, sete prefeitos de Januária foram afastados devido a crimes como nepotismo, desvio de verbas públicas e improbidade administrativa.
O primeiro investigado foi condenado pelo uso indevido de R$ 375 mil do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), recurso do governo federal que deveria financiar a boa formação de crianças em idade escolar no município.
Fábio atualmente é chamado para dar palestras no Brasil e já ajudou na criação de outras seis organizações não governamentais (ONGs) e associações de cidades próximas a Januária. “Contamos com a ajuda de uma rede profissionais da saúde, professores e empresários. São pessoas que participam dos conselhos municipais ou trabalham em órgãos públicos e, por se identificarem com a causa, fornecem informações e documentos para a associação”, explica. A Asajan tem cerca de 30 integrantes.
Situação semelhante à de Januária pode ser encontrada em outras cidades brasileiras. É o caso de Ribeirão Bonito, município de 12 mil habitantes no interior de São Paulo, onde a intenção de alguns ex-moradores em promover o desenvolvimento do lugar em que nasceram esbarrou no descaso do então prefeito, no início da década. Em meio a várias tentativas de ajuda negadas, surgiram denúncias de roubo de gasolina e de merenda escolar.
Foi quando o grupo percebeu que o problema não era a falta de recursos, mas sim o desvio de verbas públicas.
De tanto investigar, descobriram o envolvimento da prefeitura com uma quadrilha de roubo de cargas que atuava na região. “Aparecia uma nota fiscal de filé mignon e as cozinheiras contavam que faltava comida nas escolas. Daí começamos a perceber que o novelo era muito maior do que podíamos imaginar”, lembra Lizete Verillo, psicóloga e atual diretora da Associação dos Amigos de Ribeirão Bonito (Amarribo).
Três anos e muito esforço depois, em 2002, conseguiram cassar o prefeito e um vereador. Em 2007, cassaram mais quatro parlamentares da câmara e, no ano passado, processaram um prefeito por improbidade administrativa.
A história rendeu um livro que está na quinta edição, com 125 mil cópias distribuídas. A associação cresceu e a experiência acumulada na última década ajudou a formar 162 ONGs. O foco agora, segundo Lizete, é o acompanhamento do Legislativo e o treinamento dessas associações. “Tivemos uma democracia interrompida pela ditadura, estamos em processo de amadurecimento, reaprendendo o nosso papel participativo, o que é irreversível. E isso, infelizmente, não se aprende na escola.
Foi por acaso que Fernando Fernandes encontrou uma série de irregularidades em Sabinópolis, no Vale do Rio Doce, em Minas Gerais. Para organizar a Festa do Rosário, ele reuniu amigos e levantou os recursos necessários por meio de incentivos federais.
Quando o dinheiro entrou na conta do município, no entanto, o prefeito disse que aplicaria os dividendos em atividades que poderiam render mais votos. Fernando, então, resolveu pedir a cassação do prefeito. Como a Câmara Municipal tinha rádio comunitária, a notícia ganhou as ruas e, claro, as rodas de conversas da cidade. Desse jeito informal foi que surgiu a Associação Brasil Legal.
Com dinheiro próprio, a ajuda de advogados e muita disposição, Fernando já moveu 15 ações, tornou um prefeito inelegível e desenvolveu 10 projetos de lei que enviou à Assembleia Legislativa de Minas Gerais e ao Congresso Nacional. O objetivo agora é incluir no currículo escolar questões básicas da Constituição, que estabelece no artigo 5º o dever do cidadão de combater a corrupção. “Muitos querem mudar o político. Mas será que isso adianta?”, questiona Fernando. “Eu acho que a saída é mudar a postura da população. Precisamos acabar é com essa frase e o pensamento ‘não gosto de política’, isso sim.”
Fonte: Daniela Almeida - Estado de Minas
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