Poderia ser pela vida política. De representante da classe empresarial, foi senador e depois vice-presidente do primeiro presidente brasileiro oriundo do operariado. Passou mais dias no exercício da Presidência da República do que o presidente Jânio Quadros. Sua presença no Planalto e o fraterno relacionamento com Lula simbolizavam uma união entre capital e trabalho.
Poderia ser por um monte de outras virtudes. No lado pessoal, o harmônico casamento de 53 anos com Mariza Gomes da Silva, a família bem estruturada com três filhos e cinco netos, a formação de um herdeiro talvez até mais empreendedor do que o pai, Josué Gomes da Silva.
Não deixa de ser louvável que um homem de pouca instrução formal (completou apenas a escola primária) tenha investido tanto na formação dos filhos, e cobrado deles a aplicação nos estudos. Seu talento e conhecimentos foram reconhecidos em seu Estado, Minas Gerais, com dois títulos de Doutor Honoris Causa.
Mas depois que o destino fez a cruzada pessoal contra o câncer se sobrepor a todo esse admirável passado, as lições que Alencar eternizou na memória coletiva da nação decorrem da luta pela vida: a fleuma diante da adversidade, a assunção de riscos pessoais, a ponto de se tornar cobaia de um remédio experimental, e a superação de momentos críticos como a cirurgia de 17 horas há exatos dois anos e dois meses.
Foram tantas batalhas elegantemente vencidas que, para médicos e jornalistas que o acompanharam mais de perto, a derrota para o câncer, que no inicio chegou a ser tida como breve, havia se transformado em impossível. Era como se José Alencar não sentisse dores, nem medo. Uma espécie de calvário público para ensinar a todo mundo que a pior das circunstâncias será sempre superada com coragem, disciplina e bom humor. E seu humor era tanto que o vice-presidente fazia troça dele.
– Outro dia uma mulher veio me dar os parabéns dizendo que o jeito que eu enfrento a doença é um exemplo para o Brasil. Eu disse para ela: “Obrigado, mas o que eu quero é ficar bom” – contava ele, com uma expressão característica que ficava a meio caminho entre a graça e a seriedade, como se oferecesse a cada interlocutor a opção que lhe fosse mais conveniente.
– As pessoas falam que eu tenho muita coragem. Mas não é coragem. É porque não tenho outra opção – dizia sobre a sucessão de cirurgias, com uma entonação entre o chiste e a resignação, novamente duas opções à escolha do ouvinte. Uma nação sabe reconhecer seus homens fortes. O Brasil hoje perdeu um dos grandes.
Autor: Luciano Suassuna Tags: José Alencar
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